INTELIGÊNCIA

16/07/2011 19:02

 

INTELIGÊNCIA ESPACIAL

 

Li recentemente que os especialistas classificam no homem diversos tipos de inteligência: a tradicional e mensurável em QI,a emocional que dá a capacidade de saber reagir às próprias emoções, a musical, a espacial, entre outras.

Dessa última, assumo, nasci completamente deficiente. Embora não me enquadre na jocosidade dos tipos que não distinguem direitas de esquerdas, o fato é que senso de direção e de profundidade espacial praticamente inexistem para mim.

Sempre gostei de pintar. Tinha facilidade para sombras e cores, mas não para perspectiva. Surpreendia-me sempre com uma amiga que desajeitadamente deitada de barriga sobre a cama conseguia desenhar em papel com bico de pena seu quarto com todos os objetos ali contidos como se vistos de um ângulo superior e inclinado a um canto do teto. Não sei como conseguia isso.

Perder-me dentro das estações de metrô é rotineiro. Nunca entendi como placas, bidimensionais, podem indicar realidades tridimensionais. Como uma seta de virar à esquerda pode indicar corretamente algo quando se vê pela frente mais três saídas à esquerda? Qual delas?

Durante um período em que tinha de levar meus filhos pequenos semanalmente ao pediatra, servindo-me do metrô, descia na Estação Brigadeiro e seguindo a escadaria saía bem de frente à entrada do prédio de consultórios. Para voltar tentava fazer o percurso lógico. E assim, entrava no vagão e o trem ia até a Ana Rosa antes de fazer o percurso de volta. Levei dois meses para descobrir que pegava a composição do lado errado.

Na Estação Anhangabaú, que esporadicamente usava anos atrás, geralmente descia de ônibus na rua Xavier de Toledo. Mas nunca consegui, no caminho de volta, sair de novo na Xavier. Segui placas, informações...tudo em vão. Quando alcançava a rua estava na Praça das Bandeiras, no meio do Vale do Anhangabaú, e nunca achei a saída da Xavier. Acabava tendo de dar uma volta imensa para pegar o ônibus que me levasse para casa. Já me falaram que tem de se pegar as escadarias e não as escadas rolantes. Não me arrisco a conferir.

Dura deve ser minha expressão facial ao descer do trem que denuncia meu estado de permanente perdição. Quando pegava o metrô com algum colega e descia antes, podia vê-lo se contorcer de rir enquanto meus olhos se arregalavam por ter de enfrentar o sombrio e labiríntico caminho de saída.

Hoje, o que me incomoda nessas situações é o tempo perdido em idas e vindas. Às vezes, a enorme frustração de ter descoberto um acesso maravilhoso para chegar aonde quero ir e que sei que nunca mais será encontrado novamente.

Mas quando alguém interrompe minha caminhada dentro de uma estação para perguntar a direção de qualquer lugar, quem solta uma bela gargalhada sou eu. Informo ao sujeito que não poderia ter perguntado à pessoa mais errada no mundo (dever ser algum tipo de deficiência não catalogada o dom de dirigir-se ao alvo exatamente oposto do que se deseja).

Um amigo meu, que também não tem o menor senso espacial (consegue perder-se até nas imediações da casa dele), tentando nos consolar disse que como os cegos que suprem a deficiência visual com a apuração de algum outro sentido qualquer, nós também devemos ter exacerbado um outro tipo de inteligência. Assim espero!

Mas acho que o pior mesmo foi quando voltava de ônibus do serviço. Com a mania de pegar o lotação alheia a tudo para poder ler, ao chegar à av. Dr. Arnaldo tomei o primeiro Pompéia que apareceu, e mesmo sem lugar para sentar, lá estava eu firme com os olhos pregados na revista. Quando notei, estava em plena Heitor Penteado...era o Pompéia errado! Meio apavorada, me informaram que o melhor seria descer e pegar uma condução que subisse a rua Apinagés para chegar à Alfonso Bovero. Ainda bem que seria no próximo ponto. Desci,caminhei quadra e meia até onde deveria pegar a tal condução quando vi um ônibus subindo a rua. Não deu nem pra ver qual era, mas como só daria para a condução subir a rua, dei sinal, corri e entrei no ônibus que estava vazio.

Pra meu espanto, o cobrador ao me ver abriu um imenso sorriso e bradou feliz: finalmente subiu alguém pra ensinar o caminho pro motorista! Fiquei paralisada e não sabia se ria ou chorava diante da situação. Mais à frente, a rua era contramão e era preciso fazer um retorno para chegar à Alfonso Bovero. Nem deu para curtir a leitura, aliás, nem pra sentar. Tive de ficar ligada no sentido dos carros e na sinalização e torcer para dar tudo certo. Enquanto isso, incutindo sua fé no motorista, o cobrador exclamava: não sei por que ele fica nervoso, sempre sobe alguém pra ensinar o caminho?!!!

Chegamos à Bovero. O percurso que fiz era curto. E bem ali onde eu desci, subiu alguém. É certo é que a profecia do cobrador se cumpria, auxiliando o motorista novato a chegar a seu destino. Na emergência, até cegos servem de guias a outros cegos...

06/11