NÃO ERA BONITA

19/06/2011 18:38

 

NÃO ERA BONITA

 

Não era bonita. Talvez até um pouco relaxada no cuidar-se. Quem sabe, pelos parcos recursos, pela rudeza dos meios e da vida que lhe fora entregue desde que nasceu. Beirava os quarenta anos, os filhos, pré-adolescentes.

Adorava servir à família: mesa abundante para agradar aos filhos, trouxera-lhe ao corpo a forma farta, como seu sorriso.

A labuta diária de espremer-se nas conduções cheias, de trabalhar como faxineira de empresa, de realizar as tarefas de casa tarde da noite e nos finais de semana, traziam-lhe ao final, o justo cansaço.

Muito simpática, falante e mansa até, desde que não se sentisse agredida. Aí virava o bicho do agreste. Mas isso era raro, e passava como as tempestades que se anunciam e nunca caem. E aí voltava o sorriso, ao qual era difícil não se entregar.

Depois da jornada exaustiva tomava seu banho, e nos dias de verão estirava-se nua no chão do quarto, para refrescar a quentura, da alma, e do corpo. Despudorada, sem exibicionismo, desde que nascera sempre dormira nua. Mas assim, no chão, com os braços e as pernas estendidos, parecia mais uma grande estrela a fulgir no céu.

O marido, chegando do trabalho e vendo-a assim no meio do quarto, insinua-se: “quer provocar?” Mas eles estavam brigados, coisa boba, mas à qual ela não cedia até dobrar-lhe a teimosia. Em sua mansidão, era dona de si, em carne e espírito. Sonolenta, apenas balbuciou:" vá dormir...!". E à noite e ao cansaço entregaram-se, ela apaziguada, ele, resignado.

01/2011